quinta-feira, 28 de maio de 2020

Inhambane - um dia "volto"



Em 1966, ou cumpria o destino obrigatório de todos os mancebos, ou desertava. Optei por “assentar praça” no quartel de Boane.
Era fevereiro.
De 1966 a 1969 (três anos e sete meses), as terras de Boane, Maxixe, Inhambane e Vila Cabral (Niassa) estão anotadas na minha caderneta militar como “residências oficiais”.
Por ser tempo de guerra, “guerreei”…
…Guerreei com as “armas” que tinha à mão em nome da paz e da fraternidade: a palavra, a caneta, o lápis, o papel e a máquina de escrever.
Ocupei-me do sonho e dele fui mensageiro através de “jornais da caserna”, manufaturados sem grande critério, das publicações periódicas impressas, das sessões de cinema de puro entretenimento, das reportagens sobre a vida nos aquartelamentos, da divulgação de usos e costumes das populações...
Recordo no “outro lado do tempo” Homoine, Mabote, Morrumbene, Massinga, Pomene… Inhambane, onde “voltarei um dia”. “Está prometido” no Último adeus a Inhambane.
À distância de meio século “sou capaz de viajar” nos barquinhos que faziam a travessia entre Maxixe e Inhambane - com sorte, posso ter por companhia uma das três irmãs, mulatas - qual delas a mais bonita. Afiançavam os “tropas”!
…Depois de sessão de cinema, em Inhambane, talvez encontre aquela jovem indiana de longos cabelos pretos, olhares marotos e de falas mansas num dialeto impercebível.
Por vezes os gestos substituem as palavras:
-“Não sei ler nem escrever, só soletrar. Dá-me a primeira letra que eu dou-te a seguinte.”
Sendo domingo, um mergulho na praia do Tofo, talvez um fim de tarde na esplanada da avenida… mas se fosse “dia de bola”, e o Ferroviário jogasse em casa, era um dever aplaudir os “nossos”.
E havia o arraial com música tradicional, à luz de um “petromax”, longe das vistas, onde se saboreava a autêntica “galinha à cafreal”, sem o uso de talheres, acompanhada de cerveja à temperatura ambiente…
E aquela vez, quando dei de caras com o “paraíso” em Pomene?
E os camarões gigantes, vivos e a saltar, a vinte e cinco tostões o quilo?
E o casamento do Fonseca em Morrumbene?
… Um dia conto pormenores de uma cena “nunca vista”: o alferes “checa” desafiou o Zé Diogo, praticante de boxe, para uma “troca” de socos na parada.
- Coitado do alferes...


sexta-feira, 15 de maio de 2020

Isto é uma "gaita", pessoal...

Acordo fora de horas com uma “coisa má aos saltos dentro da cabeça”.
E se essa “coisa” se atravessa no meu caminho, e eu sem forças nem tempo para lhe dar um piparote? Se eu tivesse vinte anos, a essa “coisa má” chamava-lhe “um figo” (como ao tempo da minha guerra em Moçambique, ou ao tempo da descolonização, ao regresso a uma terra quase desconhecida... foram tantas “coisas más” - mas, nesse tempo, tinha tempo, agora deixei de o ter. Com vinte ou trinta anos em cima das costas, (quase) todas as “coisas más” se ultrapassam com a certeza de que ainda temos tempo para sorrir e andar por aí sem medo dos lobisomens ou dos bruxedos nas encruzilhadas, dos maus olhados - tudo “ coisas más”. Agora falta-me o tempo, a mim e a todos os setentinhas.
“Vai ficar tudo bem” - leio e ouço e apetece dizer um palavrão. Vai ficar tudo bem, sim, mas para quem tem tempo - para a “malta’ da minha geração, não, já não temos tempo para essas mentirinhas de trazer por casa.
“Isto” é uma gaita, pessoal... 
Ups... seis da manhã e eu a escrever “coisas”. Sobre coisas más, claro ...

quinta-feira, 14 de maio de 2020

Sem corantes nem conservantes



Quem tem a sorte de ter um quintal nas traseiras da casa, com engenho e horas de trabalho pode retirar da terra alguns produtos hortícolas cultivados sem "corantes nem conservantes". Foi o que fiz esta manhá, très meses depois da sementeira de batatas - coisa pouca, a enxada nunca foi o meu forte. 
Garanto que a colheita, não sendo nada por aí além, pagou o trabalho e ainda sobraram uns "trocos"...